Senhoras e senhores conselheiros da
Universidade Federal de Alagoas, esta carta é fruto de nossas preocupações e
angústias. Neste sentido, pedimos que leia pacientemente, pois é chegado um
momento muito importante de decisão sobre os rumos do Hospital Universitário
Professor Alberto Antunes: ser ou não cedido e gerido pela Empresa Brasileira
de Serviços Hospitalares?
Esta pergunta deverá ser objeto de
muita reflexão, pois inevitavelmente será consequente à comunidade
universitária e, sobretudo, à sociedade alagoana – já afetada por muitas
mazelas sociais. Não é uma pergunta simples de ser respondida, mas resultado de
outras respostas:
O CONTRATO RESPEITA A AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA?
Na minuta não existe
esclarecimentos sobre as atividades de ensino, pesquisa e extensão. Sem a
clareza destas informações a ameaça à autonomia universitária é ainda maior. O
HU não pode perder a sua condição de órgão de apoio acadêmico da UFAL,
essencial para os cursos de saúde. É necessário que se especifique quem
acompanhará as atividades, quais serão as condições e estruturas das atividades
acadêmicas, etc. Quanto às pesquisas irão atender aos interesses do
contratante, conforme a cláusula sétima, inciso XI.
ESTE CONTRATO PODERÁ SER RESCINDIDO?
Apesar de estar previsto no
contrato, na prática, a rescisão sofre vários agravantes. Por exemplo: em médio
prazo, a maioria do corpo funcional do HU será de funcionários contratados pela
Ebserh através do regime celetista; numa possível rescisão estes funcionários
não poderão ser incorporados ao serviço público e a universidade ficaria
“refém” do contrato. Isto deixa claro que o atual problema de contratação dos
trabalhadores terceirizados, resultados de décadas sem a realização de concurso
público, precisa ser enfrentado desde a sua origem. Está claro também que a
Ebserh é uma manobra para “driblar” ao que rege a constituição: regime jurídico
único.
ONDE ESTÃO OS ANEXOS DO CONTRATO?
Não recebemos os anexos citados na
minuta, como quadro dos servidores que serão cedidos, inventário dos bens,
plano de reestruturação, metas e ações, etc. A minuta é extremamente genérica.
Sem o conhecimento destes elementos fica ainda mais difícil entregar o HU à
Ebserh.
QUE BENS SERÃO CEDIDOS À EBSERH?
Esta pergunta nem mesmo o CURA
conseguiu responder. No dia 18 de dezembro de 2013, o Conselho de Curadores
aprovou um parecer favorável à cessão do patrimônio do HUPAA à Ebserh. Cabe-nos
lamentar que isso tenha sido feito mesmo sem esclarecimento, em tempo, sobre a
vigência do contrato e sem a apresentação de um inventário geral com todo o
patrimônio que fora cedido.
Lamentamos também o fato de não ter
sido permitida a intervenção de nenhuma pessoa ou entidade durante a sessão,
além dos próprios conselheiros do CURA que, à propósito, não participaram da
audiência pública sobre a Ebserh promovida pelo Ministério Público Federal em
Alagoas no dia anterior.
E SE A LEI DA EBSERH FOR JULGADA INCONSTITUCIONAL?
Dispositivos da lei 12.550/11 estão
“sub judice” no Supremo Tribunal
Federal. Trata-se da ADIN 4.895 ajuizada pela Procuradoria Geral da República. Na
ação, a PGR requer a declaração da inconstitucionalidade dos artigos 1º a 17 da
norma, que tratam das atribuições, gestão e administração de recursos da
empresa ou, sucessivamente, dos artigos 10, 11 e 12, que tratam da forma de
contratação de servidores da empresa por meio da Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT), de processo seletivo simplificado e de contratos temporários.
Não há sentido a adesão a esta empresa sem que esta ação tenha sido julgada no
STF, sob o risco de violarmos a constituição brasileira. Trata-se, sobretudo,
de um imperativo ético.
A EBSERH É SOLUÇÃO PARA OS HUS? CAOS NA UFPI E UNB DEIXA CLARO QUE NÃO
Em certa ocasião, em dezembro de
2012, um dos membros da gestão da UFAL afirmou: “Não sou capaz de responder se
a Ebserh é a melhor solução para os Hospitais Universitários. Sei que é a única
solução que nos foi dada”. Afinal, a Ebserh é solução para os HUs? Respondemos
categoricamente que não.
Um exemplo emblemático pode ser
encontrado na Universidade Federal do Piauí, primeira do país a contratar a Ebserh.
Passados quase dois anos, o cenário da unidade hospitalar beira o caos: em
virtude das péssimas condições de trabalho, da falta de estrutura para atender
os pacientes e demais problemas, uma auditoria feita pelo Departamento Nacional
de Auditoria do SUS, comprovou que a Ebserh não implementou os serviços
previstos no plano contratual.
As UTIs foram abandonadas e o
hospital está lotado com pacientes em macas nos corredores. O problema no
hospital não é financeiro, já que o SUS repassa para o HU o valor de R$ 2
milhões por mês. A gravidade da situação tem ocasionado diversos protestos,
inclusive por médicos que chegaram a ameaçar um pedido de demissão coletiva.
Infelizmente, a crise com um
hospital administrado pela Ebserh não se restringe à unidade de Piauí. No
Hospital Universitário de Brasília os problemas não só não foram resolvidos
como se agravaram. Setores considerados “menos produtivos”, isto é, com menor
potencial para gerar lucro, estão sendo desmontados. As
residências de otorrino, pediatria e radiologia passaram a ser realizadas em
unidades fora da universidade. Em outras universidades também tem sido
denunciado problemas.
O GOVERNO SERÁ INFLEXÍVEL ENQUANTO FORMOS FLEXÍVEIS
Quanto ao fato de a Ebserh ser a
única solução dada pelo governo, somos uníssonos ao procurador da república
Júlio Marcelo de Oliveira: “(...) o Poder Executivo está atuando de forma
inconstitucional, ilegítima e imoral em sua tentativa de implantar a EBSERH nos
HUs deste país, usando indevidamente o nome do Tribunal de Contas da União como
meio de pressão ilegítima, de absurda coação moral, para constranger os
gestores das universidades federais, especialmente seus reitores e os diretores
dos HUs, a aceitarem essa verdadeira intervenção na gestão das universidades
como única saída legal para o grave problema dos terceirizados nos HUs”.
Para nós está claro que, do ponto
de vista ético e político, a decisão sobre a assinatura do contrato com a
empresa não pode se dar, nem de longe, por imposição de nenhum governo. Ao
contrário disto, precisamos construir e impor ao governo nossa própria
alternativa. A decisão tomada pela UFRJ nos aponta este caminho.
No que tange ao problema de
pessoal, precisamos nos enfrentar com o governo para garantirmos a realização
de concurso público e contratação via RJU, conforme determina a constituição.
Se abrirmos mão deste direito agora, estaremos mais fracos nos enfretamentos
que estão por vir em outras áreas como a própria educação pública.
ESTA DECISÃO É POLÍTICA
Diante de todos os riscos que a
Ebserh traz consigo, é claro para nós que o Consuni não pode se submeter a esta
tentativa deliberada de implantar a empresa, a revelia dos movimentos sindical,
estudantil, social, inúmeros conselhos profissionais e do próprio Conselho
Nacional de Saúde que repudia esta empresa.
Está claro para nós que esta
decisão tem um caráter político, mas a decisão que cabe ao Consuni não pode ser
vista como mera disputa de grupos políticos que, legitimamente, atuam na
universidade. Falamos de política no seu conceito mais genuíno: a disputa de
projetos que pretendem promover o bem comum.
Neste contexto, dois projetos estão
sendo disputados: o primeiro deles, alinhado às diretrizes neoliberais do banco
mundial, interessa ao governo e à Ebserh – “fazer mais com menos”; o outro
projeto é o que defendemos – gerir o HU por administração direta do Estado, com
eficiência e competência, sem abrir mão do controle social, escolhendo sua
direção através dos meios democráticos, contratando via RJU, fortalecendo o
Sistema Único de Saúde, etc.
Por fim, na menor das hipóteses, a
Ebserh é um risco gratuito. E a menor reflexão que se faça será suficiente para
rejeitarmos esse risco. Nesse sentido, esperamos que as senhoras e senhores conselheiros
atentem para a posição política de suas bases, que os elegeu, exerçam a sua
liberdade e, na melhor das hipóteses, digam NÃO a esta lógica lucrativa na
saúde e na educação pública, a este cenário coercivo e a todos os prejuízos que
a Ebserh traz intrinsecamente.
Quanto a nós, com todo nosso vigor
e reivindicando todas as garantias democráticas que precisam ser respeitadas, estaremos
mais uma vez resistindo e defendendo a condição 100% pública e estatal do nosso
hospital escola.
MACEIÓ-AL, 13 DE JANEIRO DE 2014.
ASSEMBLEIA NACIONAL DE ESTUDANTES - LIVRE
DCE UFAL QUILOMBO DOS PALMARES
e outras 77 entidades.
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